Quando amamos, qualquer encontro, mesmo fluido, rápido, impermanente, é precioso.
Na vida, temos duas dimensões: passado e futuro; um passado que se alonga e um futuro que se encolhe. Nunca temos o presente. O instante nos foge. O presente escapa, esfumaça-se, dilui-se. A única constância que existe é o fluxo do dever que transforma futuro em passado. E não há nada ou ninguém que possa impedir.
No rápido hiato entre porvir e pretérito, alguns acontecimentos se perdem, outros se eternizam. Com o passar dos anos a memória vai se tornando seletiva. No que vivenciamos, apenas um punhado de coisas fica armazenada; algumas doloridas, outras felizes.
Sempre que guardamos algum evento, eternizamos o instante. Ficam com a gente tanto coisas boas como ruins. Carregamos em algum recinto da alma, cicatrizes, traumas, olhares ferinos, frases destruidoras, gestos ameaçadores. Também mantemos, como flash, incentivos, abraços solidários, acolhimentos, sorrisos.
Esqueci o nome de amigos. Perdemos o contato e já não sei por onde andam, mas posso descrever, piadas, brincadeiras e sorrisos que fizeram desses amigos a riqueza de minha história.
Meus pais ficarão eternizados dentro de mim. Bem criança, lembro de que o dedo estendido do papai substituía a sua mão. Sempre que saíamos para algum lugar, ele cerrava o punho para deixar apenas o indicador para eu segurar. Aquele dedo era minha âncora.
Sou um museu de imagem e som. Vez por outra visito a sala onde ouço vozes e projeto filmes. Acredito que viver se reduz ao esforço de não deixar que a fração diminuta do que entendemos por tempo se disperse, mas continue impregnada na alma. Sim, viver é estocar memórias até o momento em que o corpo vai notar que vida está nos derradeiros centésimos de segundos. Aquele instante em que veremos, num relance, tudo o que entesouramos; quando fecharemos os olhos com um sorriso maroto.