domingo, 11 de dezembro de 2011

Nasci para viver!

Texto de Marcelo Viola Rezende
Filho querido!!!!

Há momentos em que me percebo sedento de luzes, com fome de abraços, carente de cores. Nessas centelhas de instantes imprecisos, sinto-me poeta, artista, violinista. Atraído pela beleza, rasgo as roupas da formalidade e cubro-me com as capas dos românticos. Subo em palcos imaginários, convivo com a boemia, declamo versos geniais, sento em botecos mal iluminados e rio sem motivo.

Nos instantes em que preciso virar a página da tristeza, lavo-me das cinzas com silêncio, troco o pranto por um sorriso gratuito e faço uma festa diferente. Assim, sem mais nem menos, passo a ver prados verdes por entre frestas estreitas de janelas fechadas, ouço trovões num céu nu de nuvens e percebo o ar salitroso do mar longínquo.

Afogo a saudade num azul áspero, pinto as fantasias de amarelo e consigo ressuscitar fantasias infantis. Viro alquimista. Aprendo a combinar cores e afugento espíritos amuados. Todo enfado foge. Meu mundo se aquarela: as amizades cobrem-se de fosforescência, as lealdades ganham cor de palha e a paz branqueja ódios antigos.

Deixo que o numinoso me enfeitice porque me sinto de outro mundo. Nasci para a eternidade. Não me contento em viver, tenho que transcender, criar, transbordar, romper. Recuso arrastar-me; não gosto de cascas, preciso quebrar os caixotes que me prendem. Sinto-me alazão, águia, sei lá o que; careço de espaços. Atrofio dentro de gaiolas; as cercas me angustiam; as garrafas me asfixiam. Rasgo mapas, corto as cordas das âncoras, não aceito cabrestos.

Viver o medo da surpresa me seduz. Quero o incontrolado, coexistir sem precisar ter domínio, lançar-me na direção do imponderado sem jamais imaginar-me um timoneiro.

Mesmo que o futuro chegue brusco, que o iminente desperte numa piscada, que a morte se antecipe, continuarei brigando. Revoltado com a falta de viço, com a inconveniência da tristeza, gritarei: nasci para viver!