domingo, 5 de setembro de 2010

Meu Deus

 Cheguei aonde cheguei carregando minha mochila com momentos bons e de pranto. Foi somando tais momentos que me vi expulso de uma zona de conforto mentirosa.
Quebraram o aquário onde eu me sentia abrigado. De repente, fui jogado no ribeiro e forçado a nadar em águas tumultuadas.
Senhor estou amargurado. Das fossas, percebi que posso me despir das fantasias grandiosas que me escondiam de mim. Tu tens um jeito delicado de limpar as nódoas mal cheirosas que encardem a pele da gente.
Ensina-me há contar os dias que não existem, e que nem sei se viverei. Por enquanto, só preciso de ajuda para tirar do alforje coisas boas e ruins, o material de minha esperança.
A dor é sorrateira, insidiosa, traiçoeira. As respostas aparentemente confortadoras se esvaziam. “Deus tem um plano”; tal frase funciona como aspirina que alivia sem curar o problema.
Nada sei e nada posso especular sobre a dor, mas minha intuição avisa que reconhecer a companhia fiel de Deus traz mais conforto do que ficar questionando.
Quem deseja viver de verdade precisa contentar-se em nunca resolver os enigmas do porvir, a rota dos labirintos, o caminho da serpente sobre a pedra, e o curso das andorinhas que anunciam o verão. Viver é dar de ombros para as respostas imprecisas e para as explicações semiplenas. Quem vive navega em rotas inéditas e portos inalcançáveis; sabe que o destino é insólito.
Somos feitos de sombras e luzes, desejos e medos, desesperos e sonhos.  Só existe aflição porque um universo de complexidades habita dentro da gente.
Nosso primeiro medo veio com o primeiro fôlego. Nada mais angustiante que o dia do nascimento. O nosso derradeiro pavor? O suspiro final. Nada mais angustiante do que a idéia de inexistir. Nascemos e morremos na angústia. Entre os dois momentos, nos acompanhamos da ansiedade que restringe, do vazio que atormenta, da inadequação que comprime.
Não se esgana a angústia. Para viver não é necessário fazê-la sumir. Basta dar-lhe significado. É possível sorrir mesmo ralando em paredes mal rebocadas.
Concordo, certas angústias são destrutivas e não devem encontrar abrigo na alma: desesperos patológicos, que corroem; cinismos frios, que apodrecem valores éticos; depressões que amordaçam a alegria. Contudo, a possibilidade de ser feliz se equilibra na corda bamba que sustenta, ao mesmo tempo, desalento e esperança.
 Viver não é para amadores. O tempo passa velozmente carregando tudo e todos. A pior angústia? Ver a areia da ampulheta, o pêndulo do relógio, a avisar que o calendário escasseia. Alguns não se dão conta que jogam a vida no lixo. Vaidades e megalomanias são ladras dissimuladas. Eternizar cada instante parece um esconderijo onde mora o segredo da felicidade.
Viver, definitivamente, não é para amadores. Que ninguém se atreva a querer tocar a vida só. Portanto, “se algum de vocês tem falta de sabedoria, peça-a a Deus que a todos dá livremente, de boa vontade; e lhe será concedida”.
Reconheço que a vida acontece nesse espaço que fica entre os porões úmidos da desgraça e os palcos festivos da felicidade. É aí onde quero dar-me, nunca esquecendo de prantear com os que choram e rir com os que bailam